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De 0 a -1: Godzilla como metáfora japonesa para Hiroshima e Nagasaki


Cena de Godzilla perseguindo uma pequena embarcação faz referência a "Jaws" (Tubarão), de Steven Spielberg.

Quando Ishiro Honda dirigiu o primeiro Godzilla (1954), o Japão ainda se recuperava da 2ª Guerra Mundial. Dentre as feridas abertas da nação, a detonação das bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, ocorrida nove anos antes, ainda cicatrizava na consciência japonesa. É nesse contexto que a nossa criatura cinematográfica, um dinossauro radioativo com um sopro atômico tão violento que derrete instantaneamente os prédios de Tóquio, surge do fundo do mar.

Exatos 70 anos depois da sua primeira aparição, o personagem, que já foi de vilão a protetor do planeta ao longo dessas sete décadas, retoma o posto de antagonista do povo japonês no mais recente filme dos estúdios Toho. Lançado em dezembro, Godzilla Minus One (2023) é mais um drama humano convincente do que uma aventura de bicho gigante para quem já se acostumou a ser sommelier de CGI...

Nesse aspecto, o vencedor do Oscar de Melhor Efeitos Visuais — que deixou superproduções hollywoodianas como Guardiões da Galáxia Vol. 3 (2023) e Napoleão (2023) no chinelo — reinterpreta o trauma das bombas atômicas, além da humilhação de quem perde uma guerra e precisa sempre reconstruir o que é constantemente destruído.


Logo de cara, acompanhamos o piloto kamikaze do exército japonês Koichi Shikishima (Ryunosuke Kamiki) que, sabendo que o seu país perderá a guerra, decide desertar de sua missão suicida e parar numa ilha sob o pretexto de falha mecânica no seu avião. É lá que Koichi e os residentes da ilha têm o primeiro confronto com Godzilla, do qual apenas o próprio piloto sai vivo. Assim, ao voltar para Tóquio e encontrá-la reduzida a escombros, o nosso protagonista está então afundado em culpa, e essa culpa é tripla: pela deserção, pela vida dos homens da ilha e pela família que já não encontrou mais quando afinal voltou para casa.

A bem da verdade, Godzilla Minus One é um filme que escancara certas culpas e parece nos lembrar de nossas fragilidades diante de colossos do acaso. Quando foi anunciado o fim da guerra, o Japão estava na estaca 0. Então, Godzilla ressurge ainda mais raivoso e mais avassalador para reduzir o que sobrou do país a -1.


Este filme — que, vale lembrar, não tem ligação com o Monsterverse da Legendary e Warner Bros — é, para mim, o melhor do lagartão nipônico desde o mencionado original, de 1954. Para quem perdeu o pouco mais de um mês que ele ficou em cartaz entre dezembro do ano passado e janeiro deste ano (no CineLaser em Tangará, ficou míseras duas semanas...), vale esperar o primeiro streaming esperto que o disponibilizar no seu catálogo. Não à toa foi aclamado pela crítica e pelo público: Minus One não é só um filme de monstro gigante; é um filme poderoso sobre guerra e todas as perdas que ela traga.

 

Título original: Godzilla Minus One

Direção: Takashi Yamazaki

Elenco: Ryûnosuke Kamiki, Minami Hamabe, Yûki Yamada

Gênero: Ação, Drama, Histórico

Ano de lançamento: 2023

País: Japão


Sinopse: 

Filme ambientado em um Japão social e economicamente devastado após o término da Segunda Guerra Mundial, na qual o país saiu perdedor. A situação chega a um nível ainda mais crítico quando uma gigantesca e misteriosa criatura surge do mar para assolar o que restou do país.


Onde assistir: sem streaming ainda.



 

Julian de Sousa é acadêmico da 6ª fase de jornalismo na Unemat tangaraense.

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