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Quanto vale ou é por quilo: os mais pobres na margem de lucro

Clássico brasileiro quase desconhecido faz paralelo entre escravidão e exploração midiática da miséria.

 
Reprodução.

Lançado em 2005, o longa dirigido por Sérgio Bianchi não poderia ser mais atual. Quanto vale ou é por quilo? faz uma analogia interessante com o nosso tempo, pois ao passo que antecipa essa nossa necessidade de mostrar falsa bondade e caridade nas redes sociais – ainda embriões na época do filme –, mostra que a solidariedade fingida de uma elite entediada já era explorada como mercado capitalizado e lucrativo em cima da periferia, da comunidade e de todos aqueles que se englobavam dentro da consciência de “menos favorecidos” desde os tempos do epa.

Com um elenco pesado – Caio Blat, Lázaro Ramos, Danton Melo, Leona Cavalli, Zezé Mota, Joana Fomm –, o filme compara a exploração humana no antigo comércio de escravos com a atual exploração da miséria por esse mesmo comércio que, hoje, se modernizou e é até "solidário". A crítica se vale daquele velho paradigma religioso de "dar sem esperar nada em troca", só que o mercado, que visa lucro, não pode arriscar tanto.

Assim, é natural pensar que a proposta do longa é provocar aquele constrangimento de quem, de repente, se pega pelado na frente do espelho cercado por uma multidão. Tem exatamente a mesma função de um romance realista do final do século retrasado: expor, escancarar uma hipocrisia inerente à nossa atuação social.

O que diria um realista de 1880 se soubesse que, no nosso tempo atual, existiriam influencers politicamente tão corretos e exemplares por fora, ao passo que colecionando polêmicas, dissabores e demônios por dentro? O filme, já em 2005, brincou justamente com esse paralelo ao se dividir em duas ambientações: a colonial e a atual. Semioticamente, é como se dissesse que as práticas solidárias já eram lucrativas desde a época da Ilha de Vera Cruz. E apesar dos mais de 100 anos separando aquele tempo deste nosso, essas práticas nunca se aboliram – apenas se maquiaram.

No fim, podemos tirar três lições:

  1. Absolutamente tudo é lucrativo, e o conceito de lucro anestesia toda e qualquer humanidade do ser humano.

  2. Em algum momento, a elite religiosa se compadece da própria ação vil na sociedade, e busca qualquer atividade que a redima diante do juízo divino. A solidariedade é uma das favoritas.

  3. Os menos favorecidos se perpetuam nesse estado não pela falta de dinheiro, mas pela falta de conhecimento.

O filme, a propósito, está completo no YouTube, aqui.

 

Julian de Sousa é acadêmico da 7ª fase de jornalismo na Unemat tangaraense.

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